quinta-feira, junho 30

Fora do que sou

Acima da falta
Do longe e da saudade
À frente do ir
Do querer e da vontade
Por trás do fim
(o verso não é meu)
Por baixo do ser
Não sei onde estou
Dentro da vida
Da saúde e da loucura
Ao lado da escolha
Da liberdade e da censura
Perto do corpo
A alma não é minha
Fora do sentir
Não sei quem sou


>Tiago Martins

quinta-feira, junho 16

Análise de mim para Mim

Sento-me numa cadeira velha de praia, há muito esquecida na varanda, e vejo a madrugada passar por mim... com o bloco de notas e a caneta pousados... as palavras já não consolam... apenas dissimulam a verdadeira necessidade de deitar abaixo as muralhas, mandar embora os soldados e... só... chorar!
Percorro o caminho até ao espelho mais próximo e delicio-me com a minha imagem: cabelo despenteado, caído para a frente, olhos verdes, mais vivos do que nunca, contrastam com o vermelho circundante, as lágrimas caem rapidamente até aos meus lábios, rosados, inchados... fechados..., ou até ao pescoço já inundado... Não me vejo a mim no espelho, não sei onde me possa ter deixado...
Os pensamentos voam, saltam uns por cima dos outros, e atropelam-se, até! Antigamente conseguia metê-los em pequenas gavetas e tudo ficava bem... agora estão irrequietos, incansáveis,... Sinto que o caos e a loucura me possuiram!
Morri... pode soar um pouco mórbido, mas o meu olhar... apático, sem brilho, sem vida... simplesmente morto! Choro mais, agora por medo, por me ver de fora de mim e... impávida, imóvel! Quero partir o espelho e ver-me sangrar para saber se ainda vivo!!! Sei que respiro, mas não chega!!!
Desisto de me tentar encontrar no que é apenas uma imagem de mim reflectida e vou à varanda, a velha cadeira... já me abraçou tantas vezes, hoje não vai ser diferente! O céu já clareou, há três fios de núvens e um rasto de um avião... alaranjados pela cor dos primeiros raios do sol... Respiro paz! Ouço harmonia! Limpo a mente e fecho os olhos... saboreio o tempo!
Agora, um pouco mais calma, por já ter esgotado as lágrimas, sento-me devagar, como quem segura o copo de whisky na mão e o deixa deslizar lentamente pelos lábios, sorvendo aos poucos a bebida refinada de Baco! Pego no bloco e na caneta... vou escrever algo...

quarta-feira, junho 15

Chagas

Não sangro como os mortais.
Não sangro de forma alguma.
Julgo-me vazio de tudo.
Nem sangue tenho nas veias.
Abri chagas em todo o corpo.
Por tantas chagas abertas,
Meu corpo não sangra mais.


>Tiago Martins

sexta-feira, junho 10

Morre!

Em mim tenho a ti,
selvagem comedor de almas...
vives olhando de soslaio
desinteressado da minha essência...

Teu olhar descarado,
nojento sobre mim, onde quer que vá...

Teu sorriso sarcástico
de pensamentos a mim alheios,
posso apenas especular...
e o meu olhar esconder.

Mas sinto o teu bafejar
sobre o meu ombro
sempre que nos cruzamos,
e o teu despir-me...

Nojo!!
do teu cheiro
do teu olhar
do teu sorrir
do teu andar

Nojo!!
de ti... que olhas e julgas
e pensas e sabes
e contas e inventas
e conheces tudo
e sabes tudo...
Não sabes?

Morre animal demoníaco,
escondido atrás de todos e ninguém dá conta?
Todos fingem não te ver
mas eu sinto o teu odor... seco,
e húmido de quem saliva
por ser visto... a nú!

Leve

Apetece-me correr
pelo pontão da Praia Norte.
Mas tenho medo de voar,
soprado pelo vento
como uma folha de papel.
Não como as do meu caderno,
que essas são pesadas.
Como uma folha imaculada
sem o peso da rima,
nem cantos vincados
pelo dobrar de palavras.
Correr leve de tudo,
e que tudo me leve o vento.
Espalhe as sementes ruins
bem longe de mim.


>Tiago Martins